segunda-feira, 3 de julho de 2017

Emily Dickinson - Sobre a amplitude de nossas ações

 


          "If i can stop one heart from breaking,
            I shall not live in vain;
            If i can ease one life the aching,
            Or cool one pain,
            Or help one fainting robin
            Unto his nest again,
            I shall not live in vain"



   O que mais me admira na Emily Dickinson é sua capacidade de ser profunda, sem perder a sutileza. Seus poemas nunca são pesados, mesmo quando tratam de temas mais densos e obscuros, como a morte e a eternidade. Seus poemas raramente expõem um declínio ao pessimismo - ao contrário, parecem uma constante luta contra esse declínio. Esse poema expõe bem esse espírito de seus poemas em geral - de fato, é um poema bem simples, tanto na mensagem quanto na forma. Devido a isso, pode parecer superficial para uns, e até ingênuo; mas compreendendo de fato sua mensagem, vê-se então a profundidade da poetisa.
   O poema demonstra a fé de Dickinson num sentido - o de fazer o bem aos outros seres. Portanto, esse poema não apenas é contra o pessimismo, ao afirmar um sentido, como também expõe uma fé na amplitude de nossas ações. Ou seja, para ela, nossas ações boas nunca serão em vão, por menor que pareçam - para entender essa matemática das ações, basta imaginá-las numa escala global. Somando todas essas pequenas ações de altruísmo e bondade para com os outros seres, há uma mudança real no status das coisas. Não uma mudança na estrutura metafísica do mundo, ou algo parecido, mas na forma mesmo como as coisas se manifestam. Da mesma forma, porém, do outro lado dessa moeda maniqueísta, a soma de todas as ações consideradas egoístas e más tem sua influência negativa no mundo.
   Na série Fargo, em um dos episódios, há uma parábola do homem rico. Ele abre o jornal um dia, e vê que o mundo é cheio de miséria. Ele então dá toda sua fortuna para melhorar a situação; o mundo, porém, continua com sua miséria. Ele vê então outro artigo no jornal, percebendo que apenas dar sua fortuna não era o suficiente; ele vai ao médico e diz - eu quero doar meu rim. A cirurgia é um sucesso, mas doar seu rim não consertou o mundo. Então ele volta ao médico e diz - "eu quero dar tudo. Tudo que sou, tudo que tenho". O médico diz que doar o rim é uma coisa, mas que doar todos os órgãos seria loucura e suicídio. Mas o homem não poderia continuar vivendo sabendo que as pessoas continuam sofrendo, e ele dá a única coisa que lhe resta, sua vida. Ora, é uma parábola clássica de niilismo, e o que Emily Dickinson propõe em seu poema é uma antítese disso - ela não tem a pretensão de salvar o mundo, de acabar com todo seu sofrimento. Ela tem consciência de seus limites, mas também do quão amplas suas ações podem ser. Sua principal mensagem é afirmar que nossas ações no mundo, no caso as altruístas, tem sua diferença; embora não acabem com o sofrimento do mundo, se levarmos todas elas em contas, são elas que fazem de nosso mundo um lugar muito mais agradável e amável. Ela se contenta com seus limites, com o fazer de pequenas boas ações - é a mais bela aceitação de sua condição enquanto um limitado ser humano, de carne e osso.

Um comentário:

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